quinta-feira, 19 de setembro de 2024

Festa da Santa Cruz - 14/09/2024 A+D


Hoje, não temos diante de nós a cruz original. O que possuímos em nosso altar é uma representação dela. No entanto, mesmo sem a presença física da cruz original, os benefícios do sacrifício realizado nela continuam vivos e acessíveis a cada um de nós. Ainda hoje, recebemos os frutos desse sacrifício por meio dos meios da graça: a Palavra e os Santos Sacramentos.

Na pregação da Palavra de Deus, temos a oportunidade de contemplar Cristo crucificado com os olhos da fé, pois, como afirma São Paulo na segunda leitura de hoje: “nós pregamos a Cristo crucificado” (1Co 1.23). Assim, ao ouvirmos e lermos a Palavra de Cristo, presenciamos, aquele ato de amor realizado por nós na cruz. Contudo, não é apenas na Palavra que encontramos essa presença. De maneira especial, na Santa Ceia, em cada culto, temos o privilégio de receber os frutos da cruz. De fato, assim como no Jardim do Éden uma árvore produziu frutos, e por meio de um desses frutos, ao ser consumido de forma desobediente por nossos primeiros pais, o pecado entrou no mundo, assim também a cruz de Cristo nos oferece frutos – fruto da obediência do Filho: o perdão e a reconciliação com Deus. Ao nos aproximarmos da Mesa do Senhor, aquilo que foi conquistado há mais de dois mil anos, no alto do Gólgota, é hoje distribuído a nós como um presente real.

+ Pr. Filipe Schuambach Lopes
Trecho do sermão para a Festa da Santa Cruz, 14/09/2024

quarta-feira, 18 de setembro de 2024

"Subiu ao céu e está sentado à direita de Deus Pai todo-poderoso.”



Os textos de Lucas 24.51, Atos 1.9-11, Salmo 100.1 e Hebreus 1.3 nos lembram, como confessamos nos credos da igreja, que Jesus “subiu ao céu e está assentado à direita de Deus Pai todo-poderoso”. Mas, o que significa afirmar que Jesus subiu ao céu? E, se ele está à direita do Pai, como pode estar verdadeiramente presente com seu corpo e sangue na Ceia do Senhor? As nossas confissões nos ajudam!

Assim afirma a Fórmula de Concórdia, Declaração Sólida, Art. VII, da pessoa de Cristo:[1]

“[27] Agora, porém, uma vez que subiu ao céu não simplesmente como qualquer outro santo, mas, como o apóstolo testifica, subiu acima de todos os céus, também verdadeiramente preenche todas as coisas, e, presente em toda parte, governa de um mar ao outro e até os confins da terra, não só como Deus, mas também como homem, como os profetas predizem e os apóstolos testificam que, por toda parte, cooperou com eles e lhes confirmou a palavra por meio de sinais, que se seguiam. [28] Isso, porém, não se deu de maneira terrena, mas, como o Dr. Lutero explica, segundo o modo da mão direita de Deus. A mão direita de Deus não é lugar específico no céu, como alegam os sacramentários,[2] sem fundamento da Escritura Sagrada. Pelo contrário, não é nenhuma outra coisa senão o poder onipotente de Deus, que preenche o céu e a terra, no qual Cristo foi investido segundo a sua humanidade, realiter, isto é, de fato e de verdade, sine confusione et exaequatione naturarum, isto é, sem mistura e igualamento das duas naturezas na essência e propriedades essenciais delas. [29] Por causa desse poder transmitido, Cristo verdadeiramente pode estar e está presente na santa ceia, com seu corpo e sangue, conforme as palavras de seu testamento, para as quais ele nos apontou por meio de sua palavra. Isso não é possível a nenhum outro ser humano, porque nenhum outro ser humano está unido com a natureza divina nem foi investido de tal majestade divina, onipotente, e de tal poder, pela união pessoal e na união pessoal de ambas as naturezas em Cristo, como acontece com Jesus, o filho de Maria. [30] Nele, a natureza divina e a natureza humana estão pessoalmente unidas, de modo que em Cristo ‘habita corporalmente toda a plenitude da divindade’ (Cl 2[.9]). Nessa união pessoal, as duas naturezas têm comunhão tão excelsa, íntima e indescritível, que até os anjos ficam admirados e, conforme São Pedro testifica, se deliciam e se alegram em contemplar”.

Colocando isso em outras palavras, conforme explicado acima, a ascensão de Cristo ao céu, não foi como a de qualquer outro santo. Ao contrário, ele subiu acima de todos os céus e, como o apóstolo testifica, preenche todas as coisas (Ef 4.10). Essa ascensão significa que Cristo governa de modo onipresente, não apenas como Deus, mas também como homem. Esse governo é descrito de forma clara pelas Escrituras, com Cristo confirmando a palavra dos apóstolos por meio de sinais que se seguiram à sua ascensão (Mc 16.20).

Dizer que Cristo está à "direita de Deus" não é dizer que ele se localiza em um espaço físico no céu, como argumentam alguns, mas sim que ele está investido no poder onipotente de Deus, que preenche o céu e a terra (Hb 1.3). Lutero explica que a mão direita de Deus não é um lugar específico, mas o poder divino. Assim, Cristo, em sua humanidade, recebeu esse poder sem confusão ou mistura de suas duas naturezas, divina e humana (Cl 2.9).

Por causa desse poder divino, Cristo pode estar verdadeiramente presente na Santa Ceia com seu Corpo e Sangue, conforme ele mesmo prometeu em seu testamento (Mt 26.26-28). Essa presença real não é possível para nenhum outro ser humano, já que nenhum outro está unido à natureza divina da forma que Cristo está. Somente Jesus, o Filho de Maria, pela união pessoal de suas duas naturezas, pode estar presente de maneira tão excelsa, como atestado pelas Escrituras, que dizem que "nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade" (Cl 2.9 - NAA).

Portanto, a ascensão de Cristo ao céu e sua presença na Ceia do Senhor são possíveis porque ele governa de modo divino, investido de poder, sem confusão de suas naturezas, e cumpre suas promessas de estar presente em todas as coisas, inclusive e de forma mais que especial, no Sacramento da Ceia (Mt 28.20).


[1] Livro de Concórdia, 2021, página 667

[2] Os sacramentários viam os elementos da Ceia como símbolos ou representações da presença espiritual de Cristo. Entre os mais proeminentes sacramentários estavam Ulrico Zuínglio e João Calvino, que promoviam a ideia de que o pão e o vinho eram símbolos que apontavam para Cristo, mas não continham a sua presença corporal.

Você sabia que o seu pastor realiza "milagres"?


Olhe o que Lutero afirma sobre isso:

"Pois, visto que a palavra de Deus, quando ensinada corretamente, não pode deixar de produzir incessantemente grandes coisas e fazer milagres, também [o pastor] realizará grandes coisas e tão-somentes milagres sem cessar perante, como, por exemplo, ressuscitar mortos, expulsar demônios, devolver a vista a cegos, recuperar a audição de surdos, purificar leprosos, curar mudos e pôr aleijados a andar. Ainda que isso não aconteça fisicamente, não deixa de acontecer espiritualmente na alma, o que é um milagre muito maior. [...] Não que o fizesse como ser humano, mas quem faz é o seu ministério instituído por Deus para isso, e a palavra de Deus que ele ensina, pois ele é o instrumento para isso. [...] Se realiza essas grandes obras e milagres espiritualmente, decorre daí que também os realiza fisicamente, ou, no mínimo, é o iniciador deles e sua causa. Pois, de onde procede que no dia derradeiro os cristãos ressuscitarão dos mortos, que todos os surdos, cegos, aleijados e quaisquer que tenham sido as mazelas do corpo hão de desaparecer, e que seus corpos não apenas serão maravilhosos, bonitos, sadios, mas inclusive irão luzir brilhantes e belos como o sol, como o afirma Cristo? Não será porque foram convertidos, chegaram à fé, foram batizados e incorporados a Cristo aqui na terra por meio da palavra de Deus? como o diz Paulo em Rm 8.11: ‘Deus ressuscitará nossos corpos mortais por amor de seu Espírito que habita em nós’. Quem conduz a pessoa humana a essa fé e princípio da ressurreição corporal se não for o ministério da pregação e a palavra de Deus que [o pastor] exerce? Acaso, não é isso uma obra e milagre infinitamente maiores e mais maravilhosos do que se ressuscitasse fisicamente ou temporalmente mortos para essa vida e se ajudasse a cegos, surdos, mudos, leprosos neste mundo e na existência corruptível?"
O trabalho espiritual realizado por um pastor, ao pregar a Palavra de Deus e ministrar os sacramentos, é infinitamente mais significativo do que os milagres físicos. A fé que a Palavra desperta leva à ressurreição e à vida eterna, e essa é a verdadeira obra milagrosa que Deus realiza por meio de seu ministério. Portanto, valorize o seu pastor, valorize a Igreja, especialmente os momentos de culto. É nesses momentos que Cristo vem ao nosso encontro, nos tocando com seu amor por meio da Palavra e dos Sacramentos. E é principalmente na Santa Ceia que experimentamos o maior dos milagres: Cristo nos dando sua vida, sua presença e sua graça.

- Citação retirada de Uma prédica para que se mandem os filhos à Escola in Obras Selecionadas, volume 5, p. 337.