Uma prática não incomum durante o Serviço do Sacramento em algumas congregações da LCMS (e também na IELB) é a omissão do Prefácio, do Prefácio Próprio e do Sanctus. Numa tentativa de abreviar o culto (mesmo que minimamente, diga-se de passagem), a ordem resultante geralmente é algo como: sermão, ofertas, orações, Pai Nosso e, em seguida, diretamente as Palavras da Instituição (Verba). Embora a transição seja certamente fluida, vale a pena refletir sobre o que se perde nesse processo.
O que se perde não é nada menos do que algumas das partes mais antigas do Culto Divino. O diálogo de abertura do Prefácio, por exemplo, remonta à Tradição Apostólica do início do terceiro século, com a implicação de que já era usado bem antes disso. Esse diálogo, que nos convida a elevar nossa mente às coisas do alto (Colossenses 3.1) enquanto começamos nossa ação de graças pelas ricas bênçãos do Senhor neste Sacramento (Santa Ceia), logo se tornou o início fixo do Serviço do Sacramento (Liturgia da Santa Ceia) tanto no Oriente quanto no Ocidente. Cerca de um século depois, sua ampliação já estava firmemente estabelecida em todo o mundo mediterrâneo, com muitos dos ritos antigos literalmente se atropelando em ações de graças a Deus:
“É verdadeiramente digno e justo, conveniente e proveitoso, louvar-te, [entoar-te hinos,] bendizer-te, adorar-te, glorificar-te, dar-te graças.”[1]
O ponto enfatizado em todos esses ritos antigos é claro: não há resposta mais apropriada à misericórdia que Deus nos mostra nesta santa ceia do que reconhecer que tal ação de graças é de fato digna em todos os tempos e lugares.
Claro, há mais. Por meio do Prefácio Próprio, ouvimos — em pequenos trechos distribuídos ao longo do Ano da Igreja — os feitos salvadores de Cristo, tudo o que ele realizou por nós. E então, com grande solenidade, o Prefácio conclui com aquelas palavras familiares (“por isso com anjos e arcanjos...”), que reconhecem uma realidade acessível apenas pela fé — a saber, que nós, reunidos aqui, seja uma congregação de centenas ou apenas alguns fiéis, não estamos sozinhos em nossa ação de graças. Pelo contrário, é a verdade inabalável de que nossas vozes se unem ao grande coral de santos e anjos que habitam na presença mais próxima de Cristo. Em nenhum outro momento do culto esse mistério é tão claramente reconhecido ou tão eloquentemente expresso.
O que é que então dizemos com essa grandiosa companhia celestial? É o “Santo, Santo, Santo” dos anjos reunidos ao redor do trono de Deus (Isaías 6.3; Apocalipse 4.8); à sua incessante adoração de Deus unimos nossas vozes por esse breve momento. Diferente dos antigos israelitas, que eram instruídos a buscar a glória do Senhor num lugar específico (isto é, o propiciatório sobre a arca da aliança), reconhecemos que a glória do Senhor agora se manifesta em todo lugar onde o seu mandamento de comer e beber de sua carne e sangue é fielmente cumprido. Por isso, nós o aclamamos com clamores de súplica (“Hosana!”), confiantes de que aquele que entra em nosso meio por meio dos humildes sinais do pão e do vinho traz vida e salvação. Bendito, de fato, é ele!
Se, por questão de tempo, for necessário encurtar o Culto, que não seja o Prefácio e o Sanctus que sofram esse corte. Despedimo-nos do hino final, que nem sequer está listado como parte obrigatória do culto, ou do hino de invocação, que aparece apenas sob uma rubrica opcional. Corte os noventa segundos do sermão ou das orações, se for preciso. Mas não prive os fiéis deste momento sublime, quando suas vozes se unem à companhia celestial para reconhecer o Senhor que está em seu meio.
GRIME, Paul J. May we sing the Sanctus, please?. Concordia Theological Quarterly, Fort Wayne, IN, v. 84, n. 3–4, p. 363–368, jul./out. 2020. Tradução de Filipe Schuambach Lopes.
[1] “Liturgia de São Tiago”, em R. C. D. Jasper and G. J. Cuming, Prayers of the Eucharist: Early and Reformed, 3rd ed. (Collegeville, MN: Liturgical Press, 1987), 90. Observe-se a semelhança dessas palavras com as do Gloria in Excelsis, que também tem origem oriental dessa mesma época.
Nenhum comentário:
Postar um comentário