A Palavra e os sacramentos definem a unidade entre os cristãos. Em um de seus salmos, o rei Davi expressa a grande beleza dessa unidade:
“Oh!
Como é bom e agradável viverem unidos os irmãos! É como o óleo precioso sobre a
cabeça, o qual desce pela barba, a barba de Arão, e desce para a gola de suas
vestes. É como o orvalho do Hermom, que desce sobre os montes de Sião. Ali o
Senhor ordena a sua bênção e a vida para sempre” (Salmo 133).
Davi menciona Arão e
Sião, não Moisés e Jerusalém, porque está falando da unidade na igreja, não na
nação. Segundo Davi, a unidade é boa, prazerosa e preciosa. Onde há essa
unidade, também estão presentes a bênção de Deus e a vida eterna. Reconhecendo
a importância da unidade, São Paulo destaca sua relevância ao escrever aos
Efésios para que façam tudo o que puderem para mantê-la: “fazendo tudo para
preservar a unidade do Espírito no vínculo da paz. Há somente um corpo e um só
Espírito, como também é uma só a esperança para a qual vocês foram chamados. Há
um só Senhor, uma só fé, um só batismo, um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre
todos, age por meio de todos e está em todos” (Efésios 4.3-6). Assim como
Deus é um, há um só corpo, a igreja, um Espírito, uma fé, um batismo.
Na Igreja Luterana,
procuramos expressar em nossa prática essa unidade exaltada por Davi e Paulo.
No Culto Luterano, reconhecemos a unidade essencial entre a fonte do batismo, o
púlpito e o altar. A fé na qual uma criança é batizada é a única fé verdadeira
mencionada por Paulo aos Efésios. A fé que o pastor proclama do púlpito não é
sua própria opinião, mas a única fé verdadeira expressa no credo. E a fé
confessada no altar, quando recebemos a Santa Ceia, não é a fé individual de
cada fiel. O perdão recebido na Santa Ceia está ligado à “fé” da igreja.
Portanto, a fonte, o púlpito e o altar expressam unidade na fé. Os pastores
luteranos não pregam algo diferente da fé na qual a criança é batizada. Da
mesma forma, os comungantes não vêm ao altar com crenças que contradizem o que
é pregado do púlpito.
Por exemplo, quando somos
batizados, não somos batizados em nome de qualquer deus. Somos batizados
especificamente em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. A pregação do
pastor orienta a fé das pessoas não para algum deus, mas especificamente para o
Deus Triúno. Se o pastor não prega para guiar as pessoas a crer no Deus do
nosso Batismo, não é um pregador fiel. Quando participamos da Santa Ceia, nos
aproximamos do altar com aqueles que confessam fé no Deus Triúno que nos marca
no Batismo e a quem o pastor aponta em sua pregação. Criar qualquer tipo de
desvio entre a fonte e o altar ou entre o púlpito e o altar, permitindo
variações ou discordâncias na doutrina expressa na fonte, no púlpito e no
altar, é prejudicar a unidade que Davi e São Paulo pediram para manter e
valorizar. Eventualmente, uma prática que não honra a unidade essencial de
confissão na fonte, no púlpito e no altar destruirá a integridade confessional
da igreja.
Mas há outra forma de
unidade entre a fonte, o púlpito e o altar além da unidade de confissão. O
Batismo, a pregação do evangelho e a Santa Ceia nos trazem o mesmo: graça. O
propósito do Batismo, do Evangelho e da Santa Ceia é o mesmo: criar e preservar
a fé, a fé em Jesus, nosso Salvador. Esta fé é gerada, alimentada e nutrida por
uma única coisa: a graça que vem por meio de Jesus Cristo. Assim como os
israelitas foram sustentados pelo maná enviado do céu, Sião vive pela graça que
Deus envia do céu em seu Filho Jesus Cristo, a graça que chega até nós no
Batismo, no Evangelho e na Santa Ceia.
A graça é de valor
inestimável. Sem ela, estamos longe de Deus; com ela, estamos em comunhão com
Ele. Sem ela, estamos sem esperança; com ela, temos uma esperança viva e uma
herança que não se perde (cf. 1Pedro 1.3-4). Sem ela, estamos perdidos para
sempre; com ela, vivemos para sempre.
Infelizmente, muitas
vezes as pessoas não conhecem ou não apreciam o grande valor da graça de Deus.
Como resultado, costumam questionar por que precisam ser batizadas,
especialmente se já acreditam em Jesus e no perdão conquistado na cruz. Essas
mesmas pessoas podem questionar a necessidade de se aproximar do altar, pois já
possuem o que a Santa Ceia oferece. Esse raciocínio pode parecer razoável, mas
perde sentido quando examinado com mais atenção. Sim, os cristãos que chegam à
fé em Cristo como adultos, por exemplo, já têm perdão completo por todos os
seus pecados. Se morrerem, irão para o céu. Não podem ser “mais perdoados” do
que são no momento em que creem em Cristo. Os filhos de Deus batizados e que
estão na fé vivem constantemente sob a graça de Deus e não são “menos
perdoados” em um sábado à noite antes da Santa Comunhão do que em um domingo
depois de receber o Sacramento.
Com esse raciocínio, uma
pessoa poderia decidir não se batizar nem receber a Santa Ceia nunca mais. Mas,
ao adotar esse raciocínio, uma pessoa ignora a razão pela qual os Sacramentos
foram dados. Eles são tesouros. São a graça de Deus. Não são obrigações
impostas sobre nós, mas presentes. Não são um fardo para a fé, mas a alimentam.
Quem, em sã consciência e em circunstâncias normais, rejeitaria o alimento
necessário para sustentar sua vida? A graça é o alimento que nutre nossa fé e a
sustenta. Por que deveríamos rejeitá-la? As pessoas que não querem ser
batizadas ou são negligentes em participar da Santa Ceia não acreditam no que a
Bíblia diz sobre o presente de Deus nesses sacramentos.
Imagine que eu tenha um
campo cheio de tesouros e permita que você ande por ele. Que eu lhe dê uma
bolsa e peça que guarde tudo o que encontrar. Logo, você encontra vários
diamantes e coloca na bolsa. Alguns metros adiante, descobre um monte de
grandes rubis. Você os deixará lá porque já tem diamantes? A maioria de nós
adoraria ter diamantes e rubis, então você adiciona os rubis à bolsa e
continua. Agora, você encontra algumas esmeraldas. O que fará? Diamantes, rubis
e esmeraldas são todas joias preciosas. Você não vai desprezar uma só porque
não parece com as outras. O valor vem de diferentes formas. O que pensaria de
alguém que diz: “Minha irmã herdou um milhão de dólares em ouro, mas eu herdei
um milhão de dólares em prata. Estou muito descontente.” ? Assim como pedras
preciosas, prata e ouro são diferentes, mas todas são valiosas, Deus também tem
mais de uma forma de mostrar e nos dar seu amor: o Evangelho, o Batismo e a
Santa Ceia. Seu amor e graça não têm menos valor por virem de diferentes meios.
Pelo contrário, Deus usa os três meios de graça para garantir que nos ama.
Na proclamação do
evangelho, não há dúvida sobre quem Deus deseja perdoar e salvar. A Bíblia diz:
“O Senhor... é paciente com vocês, não querendo que ninguém pereça, mas que
todos cheguem ao arrependimento” (2Pedro 3.9). Em sua primeira carta a
Timóteo, Paulo diz que Deus “deseja que todos sejam salvos e cheguem ao
pleno conhecimento da verdade” (1Timóteo 2.4). Jesus disse: “Porque Deus
amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o
que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (João 3.16). E Paulo
proclama que Cristo “morreu por todos” (2Coríntios 5.15). O Evangelho
esclarece que Deus ama a todos; Deus enviou seu Filho para todos; Jesus morreu
por todos. Portanto, podemos confiar que Jesus é nosso Salvador. No entanto,
devido ao pecado, podemos duvidar desse fato, por isso Deus manifesta seu amor
e perdão de outra maneira. Ele derrama água sobre nossa cabeça e somos
batizados em seu nome. Da mesma forma, Deus estabelece claramente em sua Santa
Ceia que sua graça é plenamente destinada a cada pessoa junto ao altar. Não
podemos ter dúvidas de que o perdão de Deus é para nós quando o corpo do
Salvador é colocado em nossa boca. Não podemos duvidar que Jesus nos salvou
quando nos dá para beber seu próprio Sangue derramado por nós na cruz.
O amor de Deus nos fala
de diferentes maneiras, mas é o mesmo amor, seja através do Evangelho, do
Batismo ou da Santa Ceia. Seu perdão, salvação e vida são transmitidos de
formas diferentes, mas são o mesmo perdão, vida e salvação que Cristo
conquistou no Monte Calvário e que nos é dado no Monte Sião. Esses tesouros de
Deus criam, nutrem e preservam Sião durante a peregrinação na terra e a
preparam para o dia em que se encontrará com o Salvador face a face, e a graça
culminará em glória eterna.
- Capítulo traduzido e
adaptado de Why I am a Lutheran. Jesus at the Center, escrito pelo Rev. Daniel
Preus e publicado pela Concordia Publishing House, 2004. Todas as citações da
Bíblia Sagrada são da versão Nova Almeida Atualizada (NAA), da Sociedade
Bíblica do Brasil.
Nenhum comentário:
Postar um comentário