segunda-feira, 26 de agosto de 2024

Os Meios da Graça

O que é um meio de graça?

A teologia luterana não aborda a questão dos sacramentos, ou meios da graça, partindo de uma definição geral ou de um conceito universal. A essência dos sacramentos não pode ser captada se forem vistos apenas como fenômenos religiosos ou rituais que também aparecem em outras religiões. Embora outras religiões possam ter práticas semelhantes ao batismo e à Ceia do Senhor, como o uso da água e refeições cultuais, não existe uma ideia universal compartilhada por trás dessas práticas. Os sacramentos cristãos são sui generis, sem comparação possível, pois foram instituídos exclusivamente pelo Filho de Deus.

Ao contrário da Igreja Católica Romana[2] e da tradição reformada,[3] a Igreja da Confissão de Augsburgo não desenvolve sua doutrina sacramental a partir de uma definição geral. A Confissão de Augsburgo aborda os sacramentos de maneira particular, tratando cada um deles individualmente. A doutrina dos sacramentos, portanto, não é deduzida de um conceito a priori, mas busca uma síntese através da observação indutiva. Isso é mais evidente no fato de que os luteranos nunca definiram com precisão o número de sacramentos. A Igreja de Roma ensina que há exatamente sete sacramentos, enquanto Genebra reconhece apenas dois. No luteranismo, o número de sacramentos pode variar (de 2 a 4), dependendo de como definimos o que é um sacramento.[4] Isso se deve simplesmente ao fato de que Cristo não instituiu um sacramento abstrato, mas instituiu a Ceia do Senhor, o Batismo, a Confissão, e o Ofício Pastoral para ministrá-los e proclamar o Evangelho. É importante lembrar que o termo “sacramento” não aparece no Novo Testamento com seu significado teológico.[5] Por isso, a ordem dos artigos na Confissão de Augsburgo revela a maneira correta do luteranismo abordar essa questão: Artigo V: do ministério da pregação; Artigo IX: do Batismo; Artigo X: da Ceia do Senhor; Artigo XI:  da Confissão de Pecados; e Artigo XIII: do uso dos Sacramentos. Só no Artigo XIII é que se diz algo geral e comum sobre todos os sacramentos tratados anteriormente, mas mesmo assim não é dada uma definição abrangente ou limitante. Esse ensino, de acordo com o princípio do sola scriptura, impede que apliquemos categorias humanas aos sacramentos, forçando-os a se encaixar em um “molde sacramental”. Isso não significa que não sejam necessárias algumas definições delimitadoras e esclarecedoras. Lutero cita uma frase do pai da Igreja, Agostinho, no Catecismo Maior, tanto no contexto do Batismo quanto na Ceia do Senhor: “Accedat verbum ad elementum et fit sacramentum: o que significa: ‘Quando a palavra se junta ao elemento ou substância natural, faz-se o sacramento’”. [6] No entanto, nossos documentos confessionais não excluem, com base nessa fórmula, a Confissão, mesmo que não envolva um elemento físico, nem negam a natureza sacramental do Ofício Pastoral. Na Apologia (art. XIII) lemos:

“Autenticamente sacramentos são, portanto, o batismo, a ceia do Senhor e a absolvição, que é o sacramento da penitência. Pois esses ritos têm o mandamento de Deus e a promessa da graça, que é própria do Novo Testamento. [...] Os sacerdotes não são chamados para realizar algum sacrifício pelo povo como era na lei, visando merecer o perdão dos pecados para o povo por meio dele, mas são chamados para ensinar o evangelho e administrar os sacramentos ao povo. [...] Se a ordem for entendida como referente ao ministério da palavra, não relutaremos em chamar a ordem de sacramento. Pois o ministério da Palavra tem mandamento divino e magníficas promessas. [...] Se a ordem for entendida dessa maneira, não nos recusaremos a chamar de sacramento nem a imposição de mãos. Pois a igreja tem o mandamento de constituir ministros, pelo qual devemos ser profundamente gratos, porque sabemos que Deus aprova esse ministério e nele está presente” (Ap, Art. XIII, p. 250-251).

Nós encontramos na Bíblia a instituição de Cristo para cada sacramento.

“Portanto, vão e façam discípulos... batizando-os... ensinando-os” (Mt 28.19-20). “Façam isto em memória de mim” (Lc 22.19; 1Co 11.24). “Recebam o Espírito Santo. Se de alguns vocês perdoarem os pecados, são-lhes perdoados; mas, se os retiverem, são retidos” (Jo 20.22-23). É notável que essas passagens, que servem de base doutrinária para os sacramentos, também fundamentam a ordenação ao ministério e o envio (missio). Sacramentos e o ofício pastoral não podem e não devem ser separados. Observamos também que, embora a Bíblia atribua várias promessas ao casamento, à doação de esmolas e à oração, esses atos não cumprem os requisitos para serem considerados sacramentos: “Sinais e testemunhos da vontade de Deus para conosco, mediante os quais Deus leva os corações a crerem” (Ap. Art. XIII, p.249).  A oração é um ato sacrificial, uma ação que parte do ser humano em direção a Deus, enquanto os sacramentos, por outro lado, são ações graciosas e salvadoras de Deus para conosco. Por isso, o convite luterano ao altar é sempre para a mesa da Ceia do Senhor, onde recebemos objetivamente os dons da graça de Deus, contrastando com a tradição evangélica, onde o chamado ao altar é uma resposta sinergística, uma decisão pessoal ou uma oração oferecida a Deus. Também não devemos, de forma alguma, confundir dons espirituais com meios de graça, pois Cristo não instituiu os chamados dons espirituais para a Igreja em um sentido restrito, nem vinculou a eles qualquer promessa de transmissão da graça. Há uma diferença tão grande entre os meios de graça e os dons espirituais quanto entre o doador do presente e os presentes.

Ao compreendermos a singularidade de cada sacramento, iremos desfrutar corretamente de todos os dons de Deus que Cristo concedeu à Igreja. Ele deu muitos dons porque sabe que precisamos de cada um deles. Não podemos colocá-los em oposição uns aos outros ou classificá-los por importância. Considero problemático se cada sacramento for visto apenas como uma forma específica da palavra (por exemplo, ao se falar da palavra como sacramento básico). Isso corre o risco de nivelar e empobrecer os tesouros concedidos à Igreja. Portanto, mesmo que falemos de termos como “sacramento audível” (sacramentum audibile) e “palavra visível” (verbum visibile), eles não devem nos enganar. É verdade que não há nada de especial nos elementos que são abençoados em si mesmos. Por isso, é precisamente a palavra, quando unida à água, ao pão e ao vinho, bem como às ondas sonoras, que os torna sacramentos e nos concede o mesmo dom de perdão dos pecados, gerando e fortalecendo a fé. No entanto, não devemos igualá-los completamente. O Batismo é o sacramento da porta, e não é repetido, enquanto a Ceia do Senhor deve ser recebida semanalmente como alimento para a vida e caminha do cristão na terra. A confissão concede o perdão dos pecados, mas não o Corpo e o Sangue de Cristo. O que dizemos sobre o Batismo, portanto, não se aplica necessariamente à Ceia do Senhor. Assim, por exemplo, aceitamos o Batismo dos reformados como válido, mas não consideramos sua Ceia do Senhor como válida. Da mesma forma, por exemplo, a absolvição pode ser dada por um leigo, mas não reconhecemos o conceito de uma “Ceia do Senhor de emergência”. Para nós, ouvir apenas a pregação não é suficiente; também precisamos da Ceia do Senhor semanalmente. Portanto, o melhor é desfrutar e admirar a particularidade de cada meio de graça e receber graça sobre graça.

Cristologia e Meios da Graça

Na exposição da teologia luterana, a cristologia, a pessoa e a obra de Cristo precedem a doutrina dos meios de graça. Isso não é apenas uma questão de método expositivo, mas contém um profundo significado teológico. Os meios de graça recebem seu significado do fato de que “o Verbo se fez carne” (Jo 1.14) A segunda pessoa do Deus eterno, imutável e invisível assumiu a natureza humana no ventre da Virgem Maria. O Espírito de Deus entra na matéria, o Criador no criado, e o Invisível se torna visível. A maneira como Deus realiza a história da salvação é sempre teologia da cruz, ou seja, o poder oculto na fraqueza, a glória na insignificância, o Espírito na matéria, a fé em vez da experiência, e a direção é sempre de cima para baixo. O princípio do conhecimento de Deus no luteranismo é: Deus absconditus é Deus revelatus somente e unicamente naquele que é Deus incarnatus. Portanto, não temos nenhum conhecimento direto do Deus Triúno, nem acesso ao Deus oculto, exceto em Cristo encarnado. Ao confessar isso, afirmamos que Deus não deseja se relacionar com as pessoas de outra maneira que não seja por meio dos meios da graça. A encarnação é um juízo contra todo misticismo que busca se aproximar do Deus nu, sem intermediários. Esse modelo encarnacional continua também nos meios de graça dentro da congregação.

A vida de Cristo, seu sofrimento vicário e morte na cruz, bem como sua ressurreição, foram, de fato, a absolvição de todo o mundo. Embora o pecado ainda atue no mundo, o coração de Deus agora é gracioso. Essa disposição graciosa de Deus significa justificação universal. A reconciliação foi realizada por Deus de uma vez por todas, mas agora ele deseja compartilhar seus frutos, para que ninguém fique sem eles. Por isso, ele instituiu os meios pelos quais nos oferece e concede essa graça. Por isso, no luteranismo chamamos os sacramentos de meios de graça, media salutis, porque eles nos transmitem Cristo e seus dons. Os sacramentos não criam uma nova graça, mas nos distribuem a graça já existente. Os sacramentos não são nossos sacrifícios ou promessas de aliança a Deus. Eles não são uma extensão do Decálogo para nós. Não são lei, mas evangelho. Embora o imperativo divino nos obrigue a seguir, por exemplo, o mandamento do batismo e a ordem do Senhor, eles não são exigências da lei para nós. Pois a obediência à lei é completamente diferente de seguir a ordenança graciosa de Cristo, pela qual Ele prometeu nos dar seus dons. Pois, embora não possamos cumprir a lei, temos o evangelho como segurança. Mas, se desprezamos o evangelho e os meios pelos quais ele é trazido a nós, tal como Cristo mesmo os instituiu, resta apenas a condenação. Lutero explica de maneira precisa a relação entre a obra da cruz e a distribuição de seus frutos. Ele responde onde, então, estamos verdadeiramente “aos pés da cruz”:

“Tratamos do perdão dos pecados de duas maneiras. Primeiro, como ele é conquistado e alcançado. Segundo, como é distribuído e dado a nós. Cristo o conquistou na cruz, é verdade. Mas ele não o distribuiu ou deu na cruz. [...] Ele o conquistou de uma vez por todas na cruz. Mas a distribuição ocorre continuamente, antes e depois, do começo ao fim do mundo. [...] Se agora eu procuro o perdão dos pecados, [...] o encontrarei no sacramento ou no evangelho, a palavra que distribui, apresenta, oferece e me dá aquele perdão que foi conquistado na cruz” (Contra os Profetas Celestiais, LW, 40, 213.)

Cristo instituiu os sacramentos para que, neles e por meio deles Cristo possa atuar neste mundo. Sua promessa de estar conosco todos os dias até o fim do mundo (cf. Mt 28.20) não é uma presença vaga, mas temos Cristo, que conhecemos, cheiramos, provamos e cuja voz ouvimos. Quando falamos dos sacramentos, estamos sempre falando de Cristo. Neles, Cristo está realmente presente. Por isso, o slogan luterano é EST! Cristo está realmente presente nos meios de graça tanto em sua natureza divina quanto humana. Os Santos Sacramentos são a ação monergística de Deus por meio de seu ministro da Palavra. Cristo batiza, Cristo distribui seu Corpo e Sangue, Cristo proclama o perdão dos pecados. Os sacramentos são, portanto, a própria ação graciosa de Deus.

Os sacramentos têm uma base objetiva, pois são a ação de Deus por meio de um instrumento humano. Recebemos e possuímos pela fé o dom de Cristo e o perdão dos pecados nos meios da graça. Fé e sacramentos andam unidos. Não de modo que a origem e a manutenção da fé estejam separadas deles, mas sim que, por meio dos sacramentos, a fé é gerada. Pois os meios da graça são sinais da graça de Deus, que não apontam para algo fora de si mesmos, mas oferecem e concedem o que prometem. Eles têm o poder de gerar fé, que por sua vez se apega a Cristo e o possui nos sacramentos. Assim, a justificação pela fé está ligada à justificação universal, embora entre elas deva ser mantida a distinção entre causa e efeito. A graça, afinal, sempre precede a fé.

Pneumatologia e Meios da Graça

Ao longo da história da Igreja, um dos grandes problemas associados ao movimento do “entusiasmo” ou “espiritualismo” tem sido a separação entre Cristo e o Espírito Santo. É importante lembrar o axioma: ubi Spiritus Sanctus ibi Christus, ubi Christus ibi Spiritus Sanctus (“onde está o Espírito Santo, ali está Cristo; onde está Cristo, ali está o Espírito Santo”).[7] Devemos ter em mente que aquele que foi concebido pelo Espírito Santo e sobre quem a pomba desceu, também enviou o Espírito Santo à Igreja. Esses eventos que indicam o envio temporal do Espírito refletem a eterna origem do Espírito a partir do Pai e do Filho (filioque). O Espírito Santo é o Espírito de Cristo. Portanto, os meios da graça são também instrumentos do Espírito Santo. O Espírito não vem até nós como uma pomba ou como línguas de fogo, mas através dos meios que Cristo estabeleceu.

Ainda hoje, enfrentamos o legado do dualismo platônico de mil anos, que separa espírito e matéria. É difícil para nós, de forma racional, entender como o Espírito pode estar presente em substâncias físicas, como água ou pão e vinho. Por isso, devemos constantemente revisar a “Theologia Crucis” (Teologia da Cruz). Deus não vem até nós diretamente em sua majestade nua, mas se oculta aos nossos olhos. O Batismo, a Ceia, a pregação do evangelho e a Confissão são os meios através dos quais o evangelho é trazido de forma material para seres materiais. Isso também tem uma profunda dimensão antropológica, pois não somos apenas seres espirituais, mas temos corpo e alma. Portanto, Deus teve que se tornar carne para que pudéssemos encontrá-lo. Da mesma forma, o Espírito Santo opera através da matéria no meio de seres materiais.

A tarefa do Espírito Santo é chamar e reunir a Igreja,[8] que é o povo de Deus, o corpo de Cristo e o templo do Espírito Santo (cf. 1Co 6.19). É através dos meios da graça que a Igreja é formada e preservada.[9] A Confissão de Augsburgo (art. VII) afirma que a verdadeira Igreja, Una Sancta, está onde o evangelho é pregado corretamente e os sacramentos são administrados corretamente. A eclesiologia luterana é, portanto, encarnacional, ou seja, sacramental, diferenciando-se do modelo católico externo e hierárquico e do modelo reformado interno e espiritualista.

Escatologia e Meios da Graça

Os meios da graça sempre contêm um elemento escatológico. Eles não estão limitados por restrições de tempo e lugar. Eles nos conectam tanto ao Calvário quanto ao juízo final. Os sacramentos estão ligados à lembrança da história da salvação, a anamnesis[10] (por exemplo, a oração de batismo de Lutero menciona o dilúvio, a travessia do Mar Vermelho, o batismo de Jesus no Jordão,[11] ou as palavras da liturgia da ceia: “Na noite em que foi traído”). Os sacramentos apontam para o passado, mas também olham para o futuro, para o juízo final e o banquete nupcial do Cordeiro. No batismo, já ascendemos para uma nova vida; a absolvição que recebemos é um prelúdio da declaração de liberdade no juízo final; e na mesa da ceia, participamos agora da refeição messiânica. Assim, a teologia sacramental mantém uma compreensão bíblica dos últimos tempos, evitando especulações sobre arrebatamentos e reinos milenaristas. Também entendemos que o anúncio de Jesus sobre a iminente chegada do reino de Deus não foi um desastre, apesar de já ter passado dois mil anos. As orações “Maranatha” na liturgia da Ceia[12] nos lembram que Cristo veio e continua a vir para o meio de sua Igreja. Ele nunca nos abandonou! Vivemos agora – não ainda a vida celestial – através dos Sacramentos. Ainda pela fé, mas em breve também pela visão.

A teologia sacramental nunca deve se restringir às “salas de aula” ou se tornar uma “teologia acadêmica”. Os sacramentos não pertencem propriamente à academia, mas aos espaços sagrados da Igreja. Nunca entenderemos os sacramentos corretamente se não passarmos semanalmente pela porta da igreja, ao lado da pia batismal, ouvirmos a Palavra de Deus no púlpito e nos colocarmos ao redor do altar para receber o verdadeiro Corpo e Sangue de Cristo. Ali, o Cristo encarnado, com todos os anjos e arcanjo e a companha celestial, está presente conosco. Portanto, a correta teologia ortodoxa surge de um ensino correto, a orto didaskalia, à verdadeira adoração, orto doxía. À medida que começamos a entender que Cristo está realmente presente através dos sacramentos, descobrimos as riquezas da liturgia antiga, a verdadeira piedade, a alegria na e da adoração.


[2] Sobre a visão romana de “meios da graça”, Pieper afirma: “Roma faz-nos acreditar que a graça conquistada por Cristo leva Deus a infundir no homem uma quantidade suficiente de graça (gratia infusa), ou seja, santificação e boas obras - e isso, é importante notar, com a cooperação constante do homem (Concílio de Trento, Sessão VI, cânon 4) - de modo que ele é capacitado a realmente merecer (vere mereri, Concílio de Trento, Sessão VI, cânon 32) a justificação e a salvação, seja de forma congrua (de acordo com justiça ou liberalidade) ou de forma condigna (por mérito real). Segundo Roma, Cristo conquistou apenas a quantidade de graça necessária para que os homens possam conquistar a salvação por si mesmos. Portanto, os meios da graça no sentido papista não são meios pelos quais Deus oferece à fé o perdão completo dos pecados e a salvação conquistada por Cristo, e através dessa oferta também opera a fé no homem ou fortalece a fé já presente, mas são meios para incitar e ajudar o homem a tais esforços virtuosos, sob direção romana, que podem gradualmente e em medida constantemente crescente (Concílio de Trento, Sessão VI, cap. 16, cânon 32) conquistar a graça de Deus para ele. [...] Com tal ensino, os meios da graça são rebaixados a meios que mantêm o homem na incerteza sobre a posse do favor de Deus”.

[3] Já em relação à visão calvinista, Pieper afirma: “Segundo o ensino dos calvinistas, como a graça salvadora é particular, não existem meios de graça para aqueles a quem a graça de Deus e o mérito de Cristo não se estendem. Pelo contrário, para essas pessoas, os meios de graça são considerados meios de condenação. [...] Os calvinistas também não têm meios de graça para os eleitos. Os crentes são expressamente orientados por Calvin a não determinar sua predestinação a partir da Palavra externa, ou seja, do chamado universal (vocatio universalis) que ocorre através da Palavra exterior (per externum praedicationem), mas a partir do chamado especial (vocatio specialis), que consiste em uma iluminação interior pelo Espírito Santo. [..] essa ‘iluminação interior’ não é causada pelos meios de graça; é realizada imediatamente pelo Espírito Santo”.

[4] “Discutir o número de sacramentos é inútil até que se chegue a um acordo sobre a definição de um sacramento. A ação do Concílio de Trento ao anatematizar todos que ensinam ‘mais ou menos do que sete’ sacramentos é tanto ímpia quanto tola. O número de sacramentos que enumeramos depende da definição adotada. Se definirmos um sacramento como um ato ordenado por Deus ao qual Ele anexou a promessa do perdão dos pecados e para o qual Ele prescreveu um elemento visível, então há apenas dois sacramentos: o Batismo e a Ceia do Senhor. Omitindo o elemento visível em sua definição, a Apologia conta também a absolvição como um sacramento”.

[5] A palavra “sacramento” vem da tradução latina da Bíblia, onde a palavra grega “mistério” é traduzida como “sacramento”

[6] Catecismo Maior, Quarta Parte: Do Batismo, p. 494, [18]

[8] Lutero, no Catecismo Menor afirma que o Espírito Santo “chama, congrega, ilumina e santifica toda a cristandade na terra, e em Jesus Cristo a conserva na verdadeira e única fé” (cf. Catecismo Menor, II – O Credo, terceiro artigo: da santificação in Livro de Concórdia, 2021, p. 390, [6].

[9] Masaki, sobre a igreja, faz a seguinte afirmação: “no Novo Testamento, diz Lutero, o nome do Senhor habita em Cristo. Onde está Cristo, aí está a igreja como um corpo unido com Cristo. Onde a igreja está, ali estão a Palavra de Deus, a Ceia do Senhor e o Batismo. A confissão de Lutero é consistente com a de Inácio de Antioquia: ‘Que seja considerada uma verdadeira eucaristia aquela que é conduzida pelo bispo. Onde o bispo aparece, ali deve estar a igreja, assim como onde está Jesus Cristo, ali está a igreja católica.’ Para Lutero, a igreja é onde Cristo está e onde os meios de graça são oferecidos. Para Inácio, a igreja é onde Cristo está e onde o bispo administra a Ceia do Senhor. Em ambos os casos, a igreja é encontrada onde Cristo entrega os meios de graça por meio do Ofício do Ministério Sagrado. Em contraste com a definição da igreja a partir do homem, aqui a igreja é confessada a partir de Cristo” (Masaki, Naomichi. The Church in Luther’s Large Catechism with Annotations and Contemporany Application”.

[10] Uma liturgia eucarística encontrada na Agenda Litúrgica da SELK (Herausgegeben von der Kirchenleitung der Selbständigen Evangelisch-Lutherischen Kirche. Band 1), traz a seguinte oração de Anamnesis: “Assim lembramos, Senhor, Pai Celeste, o sofrimento e morte redentores, de teu Filho Jesus Cristo. Adoramos sua vitoriosa ressurreição dentre os mortos, e nos consolamos com sua ascensão para tua morada celeste, onde Ele é nosso Sumo Sacerdote, que sempre intercede por nós diante de ti. E assim como pela comunhão do Corpo e Sangue de teu Filho somos um só corpo em Cristo, reúne o teu povo desde os confins da Terra e permite que, junto com todos os teus fiéis, festejemos as bodas do Cordeiro em seu reino. Através dele e no Espírito Santo, seja a ti, Pai todo-poderoso, a glória, o louvor e a adoração agora e sempre, de eternidade a eternidade. Amém”.

[11] “Onipotente eterno Deus, que de acordo com teu reto juízo condenaste o mundo incrédulo pelo dilúvio e, por tua grande misericórdia, conservaste o crente Noé e mais sete pessoas de sua família; que afogaste o endurecido Faraó com todos os seus, no mar Vermelho; que conduziste o teu povo Israel através do mesmo em terra seca, prefigurando, com isso, este banho do teu santo Batismo; e que, pelo Batismo de teu querido Filho, nosso Senhor Jesus Cristo, consagraste e instituíste o Jordão e todas as águas como um dilúvio bem-aventurado e uma rica lavagem dos pecados: pedimos por essa mesma [lavagem] tua profunda misericórdia, que queiras olhar graciosamente para este N. e abençoá-lo com fé verdadeira no Espírito; para que, por meio deste dilúvio salvador, tudo o que lhe é inato desde Adão e que ele mesmo a isto acrescentou seja afogado nele e desapareça; que seja separado dentre o número dos descrentes, conservado seco e seguro na santa arca da cristandade, sirva sempre a teu nome, ardendo em Espírito e alegre em esperança; para que, junto com todos os crentes, ele se torne digno de alcançar vida eterna, de acordo com a tua promessa; por Jesus Cristo, nosso Senhor. Amém”. Manual de Batismo Revisado in Obras Selecionadas, vol. 7. p. 218

[12] As opções 2 e 3 do Livro de Serviço Luterano (Lutheran Service Book), após a consagração dos elementos, trazem como opção a seguinte proclamação: “P Porque, todas as vezes que comerem este pão e beberem o cálice, vocês anunciam a morte do Senhor, até que ele venha. C Amém! Vem, Senhor Jesus”.

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