Recebi essa pergunta pelo Instagram:
"Quanto à reverência ao chegar no altar, é só no culto ou em qualquer momento?"
Essa pergunta toca em algo muito precioso para a vida litúrgica da Igreja: a reverência diante da presença de Cristo. E a resposta, embora simples, tem implicações profundas. A reverência ao altar não se limita ao momento do culto, porque ela expressa algo que é permanente: o reconhecimento da presença real de Cristo em seu Corpo e Sangue, como ele mesmo prometeu.
Desde pequeno, aprendemos que o altar não é apenas uma peça de mobília litúrgica. Ele é, na verdade, o centro do culto cristão. De acordo com a tradição bíblica e litúrgica da Igreja, o altar é onde céu e terra se encontram: é o lugar em que Cristo torna sua presença conhecida ao povo, por meio do seu verdadeiro Corpo e Sangue, oferecidos sob pão e vinho. Ali também se elevam as orações dos santos ao trono de Deus (COOPER, 2018, p. 38, 42). Por isso, o altar é muito mais que símbolo; é sinal sacramental da presença e ação de Cristo em favor do seu povo.
Quando nos aproximamos do altar, fazemos isso como quem se aproxima de um lugar santo. Como lembra Just, o altar é o “lugar mais santo da igreja”, o equivalente ao Santo dos Santos do Antigo Testamento. A arquitetura litúrgica, inclusive, foi pensada para conduzir os olhos e o coração até ele, pois é ali que se dá o encontro com a nova Jerusalém (JUST, 2008, p. 66, 111, 113). Ao aproximar-se do altar e receber os dons de Cristo, o cristão adentra um espaço sagrado, um "anticipo da festa futura".
Por isso, é natural que ao entrar na igreja ou ao se aproximar do altar — seja no culto ou em outro momento — o cristão manifeste reverência com gestos como inclinar-se, ajoelhar-se ou manter-se em silêncio. Cooper esclarece que esse gesto de reverência não é prestado ao móvel em si, mas a Cristo, que está verdadeiramente presente naquele lugar. E se Cristo está realmente ali, então é apropriado adorá-lo — não de forma vazia ou supersticiosa, mas como quem reconhece que aquele pão e aquele vinho consagrados são, naquele momento, o verdadeiro Corpo e Sangue do Filho de Deus (COOPER, 2018, p. 38, 61).
É importante dizer que tais gestos não são obrigatórios. Não há um mandamento que imponha ajoelhar-se ou curvar-se diante do altar. No entanto, são altamente recomendados como expressões de fé viva e piedosa. A liberdade cristã permite que esses gestos variem conforme a tradição local, a arquitetura da igreja ou as condições físicas de quem os realiza. O que importa é que, quando feitos, sejam expressão sincera de fé na presença de Cristo, e não mero formalismo.
Lang, em seu manual, destaca que o altar não é apenas um móvel funcional, como o púlpito, mas um monumento visível da presença graciosa de Deus no meio da congregação. É o lugar onde se consagra e se distribui o Corpo e Sangue de Cristo, mas também o símbolo do sacrifício de Cristo e da oração dos fiéis. Por isso, ele afirma que reverência diante do altar é reverência diante do próprio Deus, não por causa do material de que é feito, mas pelo que ele representa e realiza no culto (LANG, 1987.).
Também à luz das Escrituras e das Confissões Luteranas, sabemos que o gesto externo corresponde a uma realidade interna: discernir o Corpo do Senhor não é apenas um ato da mente ou do coração, mas também do corpo (1Co 11.29). O modo como tratamos os elementos consagrados, como os recebemos, e como nos conduzimos diante deles comunica aquilo que cremos e ensinamos. Isso se aplica tanto à proclamação do pastor quanto aos gestos litúrgicos usados na celebração (Stuckwisch, 2012).
Por tudo isso, a reverência ao altar não se limita ao momento da Santa Ceia. Trata-se de uma atitude contínua, coerente com a fé que confessa que ali, naquele altar, Cristo está presente para o seu povo. Mesmo fora do culto, aquele espaço mantém seu caráter sagrado, e por isso merece respeito e honra.
Portanto, sim — é altamente recomendável demonstrar reverência sempre que se estiver diante do altar. Não porque o altar em si tenha poder, mas porque ali, pela promessa de Cristo e por sua Palavra, Deus está presente com graça, perdão e salvação. E onde ele está, não cabe outra postura senão a de humildade, temor e gratidão.
Rev. Filipe Schuambach Lopes
MATERIAL COMPLEMENTAR:
COOPER, Jordan. Liturgical Worship: A Lutheran Introduction. Watseka, IL: Just and Sinner Publishing, 2018.
JUST JR., Arthur A. El cielo en la tierra: los dones de Cristo en el servicio divino. St. Louis: Concordia Publishing House, 2008.
LANG, Hermann. Manual da Comissão de Altar. Tradução de Vilson Scholz. Porto Alegre: Editora Concórdia, [1987].
STUCKWISCH, Rick. Discerning the Lord’s Body. Gottesdienst: The Journal of Lutheran Liturgy, 22 set. 2012. Disponível em: https://www.gottesdienst.org/gottesblog/2012/09/discerning-lords-body.html. Acesso em: 26 mar. 2025.
LIVRO DE CONCÓRDIA. As Confissões da Igreja Evangélica Luterana. Tradução de Arnaldo Schüler. São Leopoldo: Sinodal; Porto Alegre: Concórdia, 2021.
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